Sistemas Nacionais De Detecção E Controle Do Desmatamento Da Amazônia

APEAESP
CREA/SP

Nos últimos 50 anos, a aquisição de imagens digitais por satélites tem fornecido uma extensa gama de informações sobre os recursos terrestres. O aperfeiçoamento dos sistemas sensores, dos veículos espaciais e do processamento digital de imagens obtidas por Sensoriamento Remoto – SR, levaram a humanidade a contemplar seu planeta, de forma sistemática e detalhada, e expandir a compreensão e análise dos eventos dinâmicos da atmosfera terrestre. Atualmente, existem centenas de satélites orbitando a terra, alguns obtendo imagens com altas resoluções espectrais, espaciais e temporais. Em regiões como a Amazônia, com cobertura densa de nuvens, passou-se também a utilizar sensores portadores de fontes artificiais de radiação (radar, laser etc.) que atravessam as nuvens.

O Brasil, com suas dimensões continentais, tem se aproveitado da tecnologia SR no tocante ao monitoramento e exploração dos seus recursos naturais. Com significativo destaque nessas realizações, desponta o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE, que vem contribuindo na disseminação de imagens dos projetos espaciais LANDSAT, CBERS e SPOT. O INPE possui também, protagonismo na criação de programas computacionais livres (código aberto), do tipo Sistemas de Informação Geográfica – SIG, à exemplo dos softwares TerraView e SPRING.

Em colaboração com órgãos de fiscalização ambiental (IBAMA e ICMBIO), o INPE desenvolve programas de detecção e controle do desmatamento na Amazônia, citando-se: o “PRODES – Programa de Monitoramento do Desmatamento da Floresta Amazônica”, que realiza estimativas anuais de taxas de desmatamento, com base na interpretação de imagens LANDSAT e CBERS, e, o sistema “DETER – Detecção de Desmatamento em Tempo Real”, que utiliza imagens CBERS e MODIS. Adicionalmente, o INPE desenvolve o programa “QUEIMADAS” que realiza o monitoramento e prevenção de queimadas, com o apoio de imagens termais de satélites meteorológicos, em regiões de ecossistemas delicados como o Cerrado, Pantanal Mato-Grossense e Mata Atlântica. Maiores informações relacionadas a esses programas podem ser encontradas no portal WEB-INPE (https://www.gov.br/inpe/pt-br).

No contrafluxo do aporte científico produzido pelo INPE, a instituição tem sofrido seguidos ataques governamentais. Em agosto de 2019, o governo do presidente Jair Bolsonaro demitiu o diretor do INPE, Ricardo Galvão, pesquisador científico de renome internacional, com a alegação de que os dados do desmatamento, obtidos pelo programa DETER, haviam sido “espancados” para prejudicar a sua imagem e do seu governo.

Incentivados pelo negacionismo governamental, fazendeiros da região Sudoeste do Pará promoveram o “Dia do Fogo”, uma explosão premeditada de focos de incêndio constatada pelo programa QUEIMADAS. Em decorrência do aumento das taxas de desmatamento registrados naquele ano (29,5% superior ao de 2018), os governos da Alemanha e da Noruega suspenderam recursos do “Fundo Amazônia”, destinados a preservação ambiental da região, da ordem de R$300 milhões.

Em 2020, Bolsonaro criou o “Conselho da Amazônia”, subordinado a vice-presidência da república, com o viés de militarização da política ambiental amazônica, no entanto, reduziu em 25,3% a verba para fiscalização do IBAMA, em um contexto de redução de multas ambientais em seu primeiro ano de governo (queda de 34%).  Em abril, foi revelado o conteúdo de reunião ministerial, em que o ministro Ricardo Sales do Meio Ambiente afirmava ser o momento de editar medidas de desregulamentação da legislação ambiental, uma vez que os veículos de comunicação estavam distraídos com a COVID (“hora de passar a boiada…”). Em plena crise orçamentária, o governo anuncia a operação do sistema paralelo de monitoramento, “DETER INTENSO”, preocupando técnicos do setor com a duplicidade de informações e com interferências políticas no monitoramento.

O programa Queimadas apontava naquele momento, o maior número de incêndios no bioma Pantanal, desde o início da sua série histórica. Ao mesmo tempo, pesquisadores europeus publicaram estudo na revista “Nature”, apontando que mudanças climáticas (causadas pela emissão de gases estufa) possuíam potencial para transformar em Savana, 40% da Floresta Amazônica. No final do ano, o sistema PRODES registra o maior desmatamento da década (9,5%). O professor Carlos Nobre, do Instituto de Estudos Avançados – IEA/USP, alerta para o fato de que 90% desse desmatamento é ilegal, com 40% ocorrendo em terras públicas (da união) e em áreas de proteção, como terras indígenas e unidades de conservação ambiental. No apagar das luzes do ano (22/12/2020), registra-se através de imagens PLANET (alta resolução), a maior apreensão de madeira irregular da história do país (204 mil m3), na divisa dos estados do Pará e Amazonas.

Momentos surrealistas do ano de 2020: após o ator de cinema Leonardo DiCaprio criticar Bolsonaro, com relação às queimadas na Amazônia, o vice-presidente Mourão o convida para uma “marcha de oito horas na selva”. A ministra da agricultura Tereza Cristina, defende a tese do “boi bombeiro”, segundo a qual, o desastre ambiental das queimadas no pantanal, seria menor se houvesse maior atividade pecuária.

Em 2021, o governo resolveu retirar as forças armadas do combate ao desmate da Amazônia. O custo em um ano da operação foi de R$400 milhões, superando largamente, o orçamento do IBAMA para realizar a fiscalização em todo o país (R$70 milhões). Após 30 anos de pesquisa do INPE, o Brasil lança o primeiro satélite de imageamento da terra 100% nacional, o Amazônia-1. Com o endividamento público e os cortes de investimento, o projeto corre o risco de se tornar o “Amazônia-Único”. Durante a cúpula de líderes sobre o clima (23/04), Bolsonaro prometeu abreviar em dez anos o prazo para a obtenção de neutralidade climática e acabar com o desmate ilegal até 2030. Em resposta, auxiliares do presidente norte-americano Joe Bidden, argumentaram que a credibilidade do governo brasileiro deve estar alicerçada em cronograma de como o país irá atingir essas metas.

A breve revisão dos fatos recentes do atual governo, permite concluir que prevaleceram, o descaso com as iniciativas científicas e o negacionismo da crise ambiental. Por conta dessas negligências, resta evidente, que as mudanças climáticas com reflexos na agricultura, a crise hídrica nos estados de SP e PR e as grandes catástrofes na BA e RJ, já cobram da sociedade brasileira, uma mudança dos rumos na exploração dos nossos recursos. O Brasil como detentor da maior concentração de florestas tropicais e biodiversidade do planeta deve ocupar posição de destaque no enfrentamento dessa crise. Diante disso, enquanto cidadãos, como podemos agir? Em uma democracia, as pessoas podem e devem influenciar os seus governantes a assumirem posturas responsáveis com relação a compromissos ambientais e incentivos às atividades científico-tecnológicas.

Uma boa oportunidade para tanto surge com as eleições do final desse ano, nas quais, devemos cobrar propostas dos candidatos (todos se dizem a favor da ciência e da defesa ambiental). Mais do que somente cobrar, devemos analisar as propostas, nos certificando de quão comprometidos estão em incentivar a pesquisa tecnológica no país e em solucionar a crise ambiental. Em resumo, torna-se importante que os candidatos se pronunciem sobre o que de fato importa.  E o que realmente importa? Penso que, devemos exigir o posicionamento dos pretendentes a cargos eletivos, sobre temas prioritários como: desenvolvimento econômico sustentável; solução da crise orçamentária dos órgãos de ciência e tecnologia; reversão do desmonte da fiscalização ambiental; restauração de biomas prioritários e  aproveitamento de vantagens estratégicas do Brasil na questão ambiental (mercado de carbono, serviços ecossistêmicos, exploração sustentável de nossa biodiversidade, exploração racional da riqueza mineral do país; mudança da matriz energética para fontes de energia limpa, entre outras).

Engº Agroº Dr. Carlos Alberto Arantes Lagrotti
CREA: 0601652502
E-mail: lagrotti@uol.com.br

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